sábado, 19 de dezembro de 2009

Nossa moral a golpes de martelo.

Não sei se todos tem se mantido a par das notícias veiculadas nos jornais aqui de Joinville ultimamente, mas creio que a maioria já ouviu falar de um acontecimento que tem repercutido bastante: o rapaz que matou a mãe a marteladas. Para aqueles que não tem a mínima idéia do que eu estou falando, tem aqui o link de uma das inúmeras reportagens sobre o assunto.
O rapaz em questão é Giovanni Wites Bolzan. Giovanni é um rapaz inteligente, no concurso do BESC de 2004, ele foi o primeiro colocado da Regional Norte. Um feito e tanto! Porém, por motivos que me faltam conhecer (só sei de boatos), ele não passou nem mesmo dos três meses do estágio probatório do banco.
Pode aqui surgir uma dúvida: como eu sei tudo isso? Bom, eu conheço o Giovanni. Não vou dizer agora que agora que somos amigos, mas eu o conheço. Inclusive, creio que ele gostava de mim. Para aqueles que tem uma “vaga impressão” de onde o possam conhecer, refresco a memória: durante alguns anos, Giovanni foi caixa/garçom/faz-tudo do Sandubom, lanchonete que fica na frente da Univille. Lá, eu conheci o Giovanni. Tinha algum contato com ele por ser um cliente assíduo do bar, e por trabalhar no BESC, então, tínhamos alguns motivos para conversas. Talvez eu fosse o cara que mais falava com o Giovanni lá dentro. Ele sempre fez o tipo calado, mas assim que se desse um pouco de atenção, ele buscava algum contato humano.
Agora, algumas peças se encaixam nesse quebra-cabeça surpreendente que é a psique humana. Giovanni era um rapaz simples. Nunca o vi com uma roupa de marca, algum tênis caro; andava sempre de ônibus. Inclusive, quando o encontrava em algum lugar fora do Sandubom, e o cumprimentava, ele demonstrava grande prazer em ser saudado, me passando assim a impressão de que raramente algum cliente do bar se dignava a ser um mínimo educado.
Não pretendo aqui humanizar o Giovanni, nem tentar justificar o ato que dizem que ele cometeu, entretanto, parei pra pensar em algumas coisas. A imprensa sensacionalista tem deitado e rolado em cima do fato, procurando transformar o rapaz em um novo inimigo público número um. Filmam o seu rosto, dando closes desumanos, ajudando no papel de humilhá-lo, expô-lo ao ridículo e ao constrangimento público. Porém, por mais paradoxal que possa parecer o que vou dizer, ainda assim digo: ele parecia ser boa pessoa. Giovanni não dava descontos na cerveja, nem mesmo uma bala de graça, não poderia ser chamado de “gente boa”, mas isso só demonstrava o quão responsável ele era para com seus afazeres. Ele começava a trabalhar as oito da manhã e saia a hora que o bar fechava (sempre depois da meia noite).
Poderia aqui escrever frases e mais frases, parágrafos e mais parágrafos acerca do rapaz, de episódios que me vem a memória; poderia discorrer sobre como ele era solitário, incompreendido, alvo de zombarias e ridicularizado (inclusive por mim mesmo algumas vezes), mas não vou me alongar. Prefiro deixar o questionamento no ar, de o que a solidão pode fazer a uma pessoa. De como, muitas vezes, alguém que convivemos por alguns meses, anos, e que passa por nós de uma maneira quase “imperceptível”, pode ter tanta coisa acumulada dentro de si que deixa estourar de uma maneira absurda e desumana. Como muitas vezes, o nosso egoísmo, ego e vaidade passam como um trator por cima dos outros, das necessidades do próximo, e esses sentimentos destrutivos, vão muito além de ideologias políticas, costumes e religião. John e Paul já diziam a alguns anos atrás: “all you need is love” (tudo o que você precisa é amor), mas prefiro dizer que, tudo o que nos falta, é amor.
Giovanni não apenas matou a mãe a marteladas, ele destruiu também a própria vida. Alguém tem dúvida de como um assassino da própria mãe é tratado dentro da cadeia? Porém, mais do que isso, sentimos a moral da nossa sociedade sendo destruída a golpes de martelo, por não conseguirmos enxergar quando uma pessoa tem necessidades e carências; ou pior, se enxergamos, fazemos de conta que não vemos, e levamos nossas vidas pacatas e patéticas adiante, dentro das nossas zonas de conforto, utilizando-nos dos ópios sociais para anestesiar a nossa consciência, que, por mais sufocada que seja, ainda tenta, nem que seja com gemidos inexprimíveis, nos lembrar que somos seres humanos.